Acusado pelo PSDB de dar sumiço em R$ 4 milhões da campanha tucana, ele faz ameaças e passa a ser defendido por Serra
Sérgio Pardellas e Claudio Dantas SequeiraINAUGURAÇÃO DO RODOANEL
Serra aparece em foto de 30 de março de 2010 junto com
Paulo Preto, que meses mais tarde alegou não conhecer
Como candidato à Presidência da República, José Serra deve explicações mais detalhadas à sociedade brasileira. Elas se referem a um nome umbilicalmente ligado à cúpula do PSDB, mas de pouca exposição pública até dois meses atrás: Paulo Vieira de Souza, conhecido dentro das hostes tucanas como Paulo Preto. Desde que a candidata do PT, Dilma Rousseff, pronunciou o nome de Paulo Preto no debate realizado pela Rede Bandeirantes no domingo 10, Serra se viu envolvido em um enredo de contradições e mistério do qual vinha se esquivando desde agosto passado, quando ISTOÉ publicou denúncia segundo a qual o engenheiro Paulo Souza, ex-diretor da estatal Dersa na gestão tucana em São Paulo, era acusado por líderes do seu próprio partido de desaparecer com pelo menos R$ 4 milhões arrecadados de forma ilegal para a campanha eleitoral do PSDB. Na época, a reportagem baseou-se em entrevistas, várias delas gravadas, com 13 dos principais dirigentes tucanos, que apontavam o dedo na direção de Souza para explicar a minguada arrecadação que a candidatura de Serra obtivera até então. Depois de publicada a denúncia, o engenheiro disparou telefonemas para vários líderes, dois deles com cargos no comando da campanha presidencial, e, apesar da gravidade das acusações, os tucanos não se manifestaram, numa clara opção por abafar o assunto. O próprio presidenciável Serra optou pelo silêncio. Então, mesmo com problemas de caixa e reclamações de falta de recursos se espalhando pelos diretórios regionais, o PSDB preferiu jogar o assunto para debaixo do tapete.
No debate da Rede Bandeirantes, Serra mais uma vez silenciou. Instado por Dilma a falar sobre o envolvimento de Paulo Preto no escândalo do sumiço da dinheirama, não respondeu. Mas o pavio de um tema explosivo estava aceso e Serra passou a ser questionado pela imprensa em cada evento que participou. E, quando ele falou, se contradisse, apresentando versões diametralmente diferentes em um período de 24 horas. Na segunda-feira 11, em Goiânia (GO), em sua primeira manifestação sobre o caso, o candidato do PSDB negou conhecer o engenheiro. “Não sei quem é o Paulo Preto. Nunca ouvi falar. Ele foi um factoide criado para que vocês (jornalistas) fiquem perguntando.” A declaração provocou uma reação imediata. Na terça-feira 12, a “Folha de S.Paulo” publicou uma entrevista em que o engenheiro, oficialmente um desconhecido para Serra, fazia ameaças ao candidato tucano. “Ele (Serra) me conhece muito bem. Até por uma questão de satisfação ao País, ele tem que responder. Não se larga um líder ferido na estrada a troco de nada. Não cometam este erro”, disparou Paulo Preto. Serra demonstrou ter acusado o golpe. Horas depois da publicação da entrevista, em evento em Aparecida (SP), o candidato recuou. Com memória renovada, saiu em defesa do ex-diretor do Dersa. Como se jamais tivesse tratado deste assunto antes, Serra afirmou: “Evidente que eu sabia do trabalho do Paulo Souza, que é considerado uma pessoa muito competente e ganhou até o prêmio de engenheiro do ano. A acusação contra ele é injusta. Ele é totalmente inocente. Nunca recebi nenhuma acusação a respeito dele durante sua atuação no governo”. Aos eleitores, restou uma dúvida: em qual Serra o eleitor deve acreditar? Naquele que diz não conhecer o engenheiro ou naquele que elogia o profissional acusado pelo próprio PSDB de desviar R$ 4 mihões da campanha? As idas e vindas de Serra suscitam outras questões relevantes às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais: por que o tema lhe causou tanto constrangimento? O que Serra teria a temer para, em menos de 24 horas, se expor publicamente emitindo opiniões tão distintas sobre o mesmo tema?
Ainda está envolto em mistério o que Paulo Preto teria na manga para emparedar Serra. A movimentação do engenheiro nas horas que sucederam o debate da Rede Bandeirantes mostra claramente como ele é influente, poderoso e temido nas hostes tucanas. Conforme apurou ISTOÉ, logo depois do programa, Paulo Preto, bastante irritado por não ter sido defendido pelo candidato do PSDB, começou a telefonar para integrantes do partido. Um deles, seu padrinho político, o ex-chefe da Casa Civil de São Paulo, senador eleito Aloysio Nunes Ferreira, que deixou o debate logo que o nome do engenheiro foi mencionado. Outras duas chamadas, ainda de madrugada, foram para as residências de um secretário do governo paulista e de um dos coordenadores da campanha de Serra em São Paulo. Nas conversas, Paulo Preto disse que não ia admitir ser abandonado pelo partido. E que iria “abrir o verbo”, caso continuasse apanhando sozinho. Com a defesa de Serra, alcançou o que queria. Para os dirigentes do partido restou o enorme desconforto de passarem o resto da semana promovendo contorcionismos verbais para defender as ações de um personagem que acusavam dois meses antes. Em agosto, o PSDB vivia outro momento político, vários líderes tucanos reclamavam do estilo “centralizador e arrogante” de Serra, tinham dificuldades para arrecadar recursos e vislumbravam uma iminente derrota nas urnas. Agora, disputando o segundo turno e sob a ameaça de Paulo Preto, promovem uma ação orquestrada para procurar desqualificar as denúncias que eles próprios fizeram. “Às vésperas da eleição podemos ganhar o jogo. Portanto, não vou dizer nada a respeito do Paulo Preto”, disse uma das principais lideranças do partido na noite da quarta-feira 13. Esse mesmo tucano, em agosto, revelara detalhes sobre a atuação do engenheiro na obra do trecho sul do rodoanel. “Não é hora de remexer com o Paulo Preto. Isso poderá colocar em risco nossa vitória”, afirmou na manhã da quinta-feira 14 um membro da Executiva Nacional do partido, que em agosto acusara o engenheiro de desviar R$ 4 milhões da campanha. “Em agosto, depois da reportagem de ISTOÉ, procuramos empresários e eles negaram que Paulo Preto tenha pedido contribuições”, disse o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). Se fez de fato esse movimento, Guerra não teve pressa em revelá-lo. Só foi fazê-lo agora, pressionado pelas declarações do engenheiro.
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