Por
Francisco Frassales Cartaxo
Padre Cícero e Floro Bartolomeu, uma ligação quase platônica era insinuada pelos seus opositores |
- Não quero ouvir ninguém chorar nem debaixo de peia, tá entendido?
Minha avó, Joana Sales de Brito, tentava evitar o pior: a volta
desesperada de seu Zuza da Inácia, como era conhecido meu avô, do capão de mato
próximo a sua casa. Zuza avisara que só sairia do esconderijo se ouvisse choro
ou grito dentro de casa. Damião, leal cabra da família, a tudo escutou, embora
não fosse dirigida a ele tal recomendação. Ele era habituado a tarefas muito
mais difíceis naquele mundo de cangaceiros, polícia violenta, fanatismo
religioso e coronéis prepotentes do começo do século 20. Naquele dia o cabra de
confiança passaria por mais uma provação. Quando da “visita” à fazenda de meu
avô, os homens de Floro bateram em Damião sem dó nem piedade, deixando-o quase
morto, a ponto de precisar deslocar-se a Juazeiro para tratar os maus-tratos.
Por isso, não seguiu com seu Zuza para São João do Rio do Peixe, fato que
deixou a todos preocupados, como narrava minha mãe. Ela dizia também que seu pai
foi obter em Juazeiro um salvo-conduto do padre Cícero para não ser molestado na
viagem à Paraíba. Pasme o leitor, ouvi de minha mãe, inúmeras vezes, que seu Zuza
teve de pagar pelo salvo-conduto em moeda corrente!
Além das sequelas físicas sofridas, Damião tinha motivo mais forte para
retardar sua mudança para a Paraíba. Carregava no peito uma dor bem maior do
que as pancadas, pontapés e coronhadas dos capangas de Floro Bartolomeu. Ele conhecia
os agressores e, na primeira oportunidade, executou com as próprias mãos a
tarefa imposta pelos costumes da época. E o fez com o inseparável punhal de
estimação. Reza a tradição oral de minha família que Damião ajudou a abreviar a
viagem definitiva de três devotos do padim Ciço... Por isso, demorou a emigrar
para São João do Rio do Peixe. Antigo delegado de polícia em sua terra natal,
Várzea Alegre, (possivelmente no curto governo do coronel Franco Rabelo), José
Joaquim de Brito não se surpreendeu quando Damião lhe explicou o motivo de
tanta demora:
- Major, pra viajar em paz eu carecia primeiro fazer um serviço.
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