Comentário ao post "A capa da Veja"
Eu li o artigo da Veja, e só tenho uma observação: a Veja quer
enterrar a CPI, custe o que custar.
O caso Cachoeira pega diretamente o senador Demóstenes Torres
(DEM/Goiás), o governador Marconi Pirilo (PSDB/Goiás), o deputado Carlos
Alberto Leréia (PSDB/GO) e o editor-chefe da revista Veja, Policarpo
Jr.
A primeira reação da mídia, diante do escândalo, foi tentar envolver
todo mundo: Agnelo (PT/DF), Protógenes (PCdoB/SP), e a construtora Delta
-- que, segundo a imprensa, "faz negócios com o Governo Federal" --
convenientemente omitindo o fato de que a Delta faz negócios com todas
as esferas do governo, em diversos estados, inclusive São Paulo!!!
Notícias recentes da Folha, do Estadão, e da Globo, dizem que a CPI
preocupa a Dilma e setores do PT; quando os mais preocupados,
obviamente, devem ser o DEM e o PSDB.
Mas vamos assumir que as acusações sejam
verdadeiras, e que Agnelo, Protógenes, e o próprio Governo Federal
estejam envolvidos no escândalo. Este seria, sem dúvida nenhuma, o maior
escândalo da história recente do país. Maior do que o mensalão, que
segundo a Veja foi "o maior escândalo de corrupção da história do
país".
A Veja não quer investigação, e usa todos os artifícios que têm à sua
disposição para isso: apela para a PT-fobia, para o "risco para a
liberdade de expressão", para a imagem de Hitler e Mussolini... nenhum
recurso é deixado de lado no objetivo de demonstrar, por A+B, que a CPI
será péssima para o Brasil.
Vamos a alguns trechos do artigo (em negrito, intercalado com meus
comentários):
"Com o julgamento do mensalão pelo Supremo a caminho, os
petistas lançam uma desesperada ofensiva para tentar desviar a atenção
dos crimes cometidos por eles no que foi o maior escândalo de corrupção
da história brasileira"
Mas quem está fazendo "uma desesperada ofensiva para desviar a
atenção dos crimes cometidos" é a própria Veja. (Apenas como exemplo,
além dos mais de 200 telefonemas entre Policarpo e Cachoeira, agora
temos evidências de que a gravação do Hotel Nahoum -- naquela fatídica
capa contra "o poderoso chefão" José Dirceu -- foi feita pelo bicheiro.)
E a Veja continua, dizendo que "o PT espera desmoralizar na
CPI todos que considera pessoal ou institucionalmente responsáveis pela
apuração e divulgação dos crimes cometidos pelos correlegionários no
mensalão — em especial a imprensa."
A imprensa não precisa do PT para se desmoralizar. Ela tem feito isso
por conta própria.
"Esse truque funcionou na União Soviética, funcionou na
Alemanha nazista, funcionou na Itália fascista de Mussolini, por que não
funcionaria no Brasil?". E responde: "Bem, ao contrário dos
laboratórios sociais totalitários tão admirados por petistas, o Brasil é
uma democracia, tem uma imprensa livre e vigilante"
O Brasil é uma democracia, e a liberdade de imprensa não está sob
ameaça. Qualquer um pode escrever o que quiser, e sites na internet
começam a dar furos em tempo real -- antes mesmo que as revistas possam
chegar às mãos dos assinantes. Isso não significa que a imprensa possa
se associar ao crime, ocultar a existência de uma quadrilha por 8 anos
em troca de informações privilegiadas, obtidas de maneira ilegal, e
promover membros desta quadrilha a "mosqueteiros da ética".
O delírio prossegue: "Uma CPI dominada pelo PT e seus mais
retrógrados e despudorados aliados é o melhor instrumento de que a
falconaria petista poderia dispor — pelo menos na impossibilidade,
certamente temporária para os falcões, de suprimir logo a imprensa
livre, o Judiciário independente e o Parlamento."
Aqui a Veja deixa bem claro -- na sua opinião, a CPI é um instrumento
para suprimir a imprensa livre, o judiciário independente, e o
parlamento. É um instrumento para transformar o Brasil em um ditadura. É
uma simplificação grosseira -- como outras que aparecem no artigo --
com o objetivo de causar um mal-estar com relação à CPI.
A essa altura o leitor típico de Veja deve estar pensando: "esta CPI é
um perigo!"
"Enquanto o triunfo final não vem, os falcões petistas vão se
contentar em usar a CPI para desmoralizar todos os personagens e forças
que ousem se colocar no caminho da marcha arrasadora da história, que
vai lançar ao lixo todos os que atacaram o PT e, principalmente, seu
maior líder, o ex-presidente Lula."
O mais curioso, de acordo com a tortuosa lógica da Veja, é que --
mesmo que a rede de corrupção de Carlinhos Cachoeira seja
"suprapartidária", isto é, envolva diretamente o PT -- esta CPI seria de
interesse do partido.
"Lula viu na CPI a oportunidade política de mostrar que todos
os partidos pecam. Que todos são farinha do mesmo saco e, por isso
mesmo, o mensalão não seria um esquema de corrupção inaudito, muito
menos merecedor de um rigor maior por parte do Judiciário e da
sociedade. Para os petistas, apagar a história neste momento é uma
questão de sobrevivência."
Questão de sobrevivência? A presidenta Dilma tem o maior índice de
aprovação de toda a história do país, superando até mesmo o Lula; a
oposição está desorientada; a própria Veja diz que o PT estaria
caminhando rumo ao poder absoluto. Por que esta seria uma "questão de
sobrevivência"? O artigo da Veja não consegue manter-se auto-coerente; a
única coisa que está perto de se extinguir é a credibilidade da
revista.
"É tamanha a ânsia de Lula e dos mensaleiros para enterrar o
escândalo que, se preciso, o PT rifará o governador do Distrito Federal,
o petista Agnelo Queiroz, que também aparece no arco de influência dos
trambiques da máfia do jogo."
É tamanha a ânsia da Veja para enterrar a CPI que, se preciso,
deixará o petista Agnelo Queiroz livre, junto com Cachoeira, Demóstenes,
Pirilo, Leréia, e, é claro, o editor-chefe da revista, Policarpo Jr.
Para defender Policarpo, sem citar o seu nome, a revista diz: "A
oportunidade liberticida que apareceu agora no horizonte político é
tentar igualar repórteres que tiveram Carlos Cachoeira como fonte de
informações relevantes e verdadeiras com políticos e outras autoridades
que formaram com o contraventor associações destinadas a fraudar o
Erário."
É uma simplificação grosseira. Policarpo Jr. fez muito mais do que
apenas usar Carlos Cachoeira como fonte. Ele usou e foi usado. Durante
mais de 8 anos, em mais de 200 telefonemas gravados e reuniões
presenciais, Policarpo Jr ajudou a promover os interesses da quadrilha,
enquanto a quadrilha satisfazia os interesses da Veja.
A Veja sabia das relações de Demóstenes com Carlinhos Cachoeira, e
nunca falou nada. Ou melhor: enalteceu Demóstenes, chegando ao ponto de
dizer que ele era um dos "mosqueteiros da ética" do senado. A Veja
também ajudou a melar uma CPI contra Cachoeira em 2004. Em troca,
Cachoeira foi responsável por inúmeros "furos" da revista, em gravações
ilegais que envolviam terceiros.
Mas a Veja prossegue com a seguinte lição sobre a ética jornalística:
"Os petistas acham que atacar o mensageiro vai diminuir o
impacto da mensagem. Pelo que disse Marco Maia, eles vão tentar mostrar
que obter informações relevantes, verdadeiras e de interesse nacional
lança suspeita sobre um jornalista. Maia não poderia estar mais
equivocado. Qualquer repórter iniciante sabe que maus cidadãos podem ser
portadores de boas informações. As chances de um repórter obter
informações verdadeiras sobre um ato de corrupção com quem participou
dele são muito maiores do que com quem nunca esteve envolvido. A ética
do jornalista não pode variar conforme a ética da fonte que está lhe
dando informações. Isso é básico."
Se Cachoeira tivesse feito gravações de suas conversas com Demóstenes
e Pirilo, isto estaria dentro da ética jornalística.
Mas Cachoeira fez gravações contra terceiros -- pessoas que não
estavam envolvidas com eles. Para citar um exemplo, hoje sabemos que as
filmagens no Hotel Nahoum foram obra da quadrilha. A reportagem de capa
de Veja foi ironicamente intitulada "O Poderoso Chefão".
A Veja tinha acesso ao verdadeiro "chefão" -- e nunca falou nada.
A Veja teve acesso a todas as informações sobre a máfia de Goiás e
nunca denunciou o esquema.
Durante 8 anos a Veja usou e foi usada por Carlinhos Cachoeira. E é
por isso que estão com medo. Mas não é só isso:
"Motivo mesmo para uma CPI seria investigar os milionários
repasses de dinheiro público que o governo e suas estatais fazem a
notórios achacadores, chantagistas e manipuladores profissionais na
internet. Fica a sugestão."
A Veja está com medo porque não controla mais a informação. Se a CPI
sair, não haverá como filtrar as informações.
Viva os blogs!
Viva a internet!
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