domingo, 10 de novembro de 2013

Censo cósmico encontra bilhões de planetas que podem ser habitáveis como a Terra

Mountain View, Califórnia – Em algum lugar no universo, deve existir um planeta onde os vulcões fazem jorrar chocolate.
Na última segunda-feira, com base em uma nova análise de dados da sonda Kepler da NASA, astrônomos informaram que o número de planetas habitáveis do tamanho da Terra pode chegar a 40 bilhões apenas nesta galáxia.
Uma em cada cinco estrelas da galáxia que são parecidas com o Sol tem um planeta do tamanho da Terra orbitando em torno de si na zona Goldilocks – nem muito quente, nem muito fria – onde as temperaturas da superfície devem ser compatíveis com a água em estado líquido. É o que indica um cálculo hercúleo de três anos baseado em dados da sonda Kepler e realizado por Erik Petigura, estudante de pós-graduação da Universidade da Califórnia, em Berkeley.
A análise de Petigura representa um grande passo em direção ao objetivo principal da missão Kepler, que foi medir qual fração de estrelas parecidas com o Sol têm planetas do tamanho da Terra na galáxia. Às vezes chamado de "eta-Terra", se trata de um fator importante para a chamada equação de Drake, usada para estimar o número de civilizações inteligentes no universo. O artigo de Petigura, publicado na segunda-feira na revista Atas da Academia Nacional de Ciências, acrescenta mais uma nuance interessante em um cosmos que tem se mostrado cada vez mais amigável e fecundo ao longo dos últimos 20 anos.
"Parece que o universo produz inúmeros ambientes que de alguma forma se assemelham à Terra no sentido de que são propícios para a vida", disse Petigura.
Ao longo das duas últimas décadas, os astrônomos registraram mais de mil planetas em torno de outras estrelas, denominados exoplanetas, e a sonda Kepler, em seus quatro anos de vida, antes de sofrer um problema mecânico em maio passado, compilou uma lista de cerca de 3500 outros candidatos. Os próximos resultados podem suscitar planos para encontrar um planeta gêmeo da Terra nos próximos anos e décadas – uma Terra 2.0, como diz o jargão – perto o suficiente daqui para ser estudado.
O mais próximo desses planetas pode estar a apenas 12 anos-luz de distância. "Essa estrela poderia estar visível a olho nu", disse Petigura.
Suas conclusões se baseiam em um relatório divulgado no início deste ano por David Charbonneau e Courtney Dressing, do Centro Harvard-Smithsonian de Astrofísica, que descobriram que cerca de 15 por cento das estrelas menores e mais numerosos conhecidas como anãs vermelhas têm planetas parecidos com a Terra em suas zonas habitáveis. Usando pressupostos um pouco menos conservadores, Ravi Kopparapu, da Universidade Estadual da Pensilvânia, descobriu que metade de todas as anãs vermelhas possuem tais planetas. Os astrônomos estimam que existam pelo menos 200 bilhões de estrelas de todos os tipos na Via Láctea, o que leva a imaginar – quem sabe – que talvez haja alguns micróbios ou criaturas mais complicadas pela galáxia afora.
Geoffrey Marcy, da Universidade da Califórnia, em Berkeley, que orientou a pesquisa de Petigura e foi coautor do estudo, juntamente com Andrew Howard, da Universidade do Havaí, disse: "Este é o trabalho mais importante no qual eu já estive envolvido. Isso diz tudo. Existem outras Terras habitáveis por aí?"
"Estou com um friozinho na barriga", contou ele.
Em uma coletiva de imprensa realizada na sexta-feira para discutir os resultados, os astrônomos elogiaram profusamente a missão Kepler e sua equipe. Natalie Batalha, um dos principais nomes da missão Kepler, do Centro de Pesquisa Ames, da NASA, descreveu o projeto e seus membros como "o que a humanidade tem de melhor."
De acordo com o novo cálculo de Petigura, a fração de estrelas com planetas semelhantes à Terra é de 22 por cento, com uma margem de erro de 8 por cento, dependendo do modo como definimos a zona habitável.
Existem várias ressalvas. Embora esses planetas sejam do tamanho da Terra, ninguém sabe quais as suas massas e, portanto, se eles são rochosos como a Terra, se são bolas de gelo ou gás, e muito menos se é – ou será – possível habitá-los.
No entanto, temos motivos para acreditar, a partir de observações recentes de outros mundos, pelo menos alguns planetas do tamanho da Terra, se não todos eles, são de fato rochosos. Na semana passada, dois grupos de astrônomos anunciaram que um planeta do tamanho da Terra, chamado Kepler 78b, que leva 8,5 horas para completar a órbita em torno do seu sol, tem densidade equivalente a da Terra, embora seja quente demais para ser habitado por formas de vida.
"A natureza", como Petigura colocou, "sabe como produzir planetas rochosos do tamanho da Terra."
Além disso, o número é mais incerto do que poderia ser porque o sistema de apontamento da sonda Kepler falhou antes de completar seu levantamento principal. Como resultado, Petigura e seus colegas tiveram que extrapolar os planetas ligeiramente maiores do que a Terra, com translações um pouco mais breves e estreitas. Para os propósitos de sua análise, o "tamanho da Terra" considerado poderia ser qualquer um entre uma a duas vezes o diâmetro da Terra, e uma translação semelhante à da Terra ficaria entre 400 e 200 dias.
"Nós ainda não temos candidatos a planetas que sejam análogos exatos da Terra em termos de tamanho, órbita ou tipo de estrela", disse Batalha.
Já Charbonneau levantou "a questão assustadora que assombra a todos nós, caçadores de exoplanetas: será que a missão Kepler obteve dados suficientes?"
Embora a própria sonda Kepler tenha sido posta de lado enquanto astrônomos elaboram um novo programa que possa oferecer um sistema de apontamento menos flexível, ela proporcionou o envio de uma quantidade tão grande de dados que há resultados que valeriam a pena analisar ao longo de um ano inteiro, disse Batalha, além de investir no aperfeiçoamento dos dados já obtidos.
A sonda Kepler foi lançada em 2009 para realizar uma espécie de censo cósmico, monitorar o brilho de 150 mil estrelas distantes da Terra, nas constelações do Cisne e da Lira, procurando por pontos menos brilhantes que indicam a passagem de planetas na frente delas.
Petigura e seus colegas se restringiram a um subconjunto de 42 mil estrelas mais brilhantes e bem-comportadas. Eles descobriram 603 planetas, dentre os quais 10 tinham diâmetro que ficava entre uma Terra e duas Terras, e orbitavam em torno de uma zona definida por Petigura como habitável, onde receberiam entre um quarto e quatro vezes mais luz que a Terra recebe. No sistema solar, essa zona se estenderia do interior da órbita de Vênus até as áreas limítrofes da órbita de Marte.
Enquanto isso, utilizando-se de uma técnica inovadora emprestada de outros campos que trabalham com grandes bancos de dados, como a física de partículas, Petigura projetou um pipeline computacional para que pudesse inserir planetas falsos nos dados – 40 mil no total – e verificar com que eficiência o programa detectaria planetas de diferentes tamanhos e órbitas.
"Deu bastante trabalho", lembrou, explicando que teve que fazer testes com dezenas de bilhões de diferentes períodos para cada estrela a fim de encontrar planetas. "Felizmente, hoje em dia os computadores são baratos."
Sara Seager, astrônoma especializada em exoplanetas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), que não esteve envolvida no estudo, disse que o teste com o pipeline computacional tinha tornado os resultados confiáveis. "Eu diria que os pequenos planetas estão em toda parte e são muito comuns – não importa de que maneira manipulamos os dados. No entanto, a sonda Kepler não está mais em atividade e nós não temos como conseguir mais dados. Então vamos ter que nos contentar com o que já temos como sendo a palavra final, por enquanto."
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