sexta-feira, 21 de outubro de 2016

A Criação

A CRIAÇÃO
Ruy Freitas

A tradição judaico-cristã-muçulmana localiza num tempo recente e finito a criação, a partir da intervenção direta de Deus. Santo Agostinho aceita a data aproximada de 5000 anos antes de Cristo. Outro aspecto é que Deus teria criado o universo pronto e completo. A Terra seria seu centro e único repositório da vida. Todo o restante do infinito seria algo estéril, talvez apenas para a contemplação do homem, ponto mais alto da criação.

Acreditavam os antigos que a abóbada celeste seria algo sólido (daí firmamento). Vem de tal equívoco a descrição no livro Gênesis (Gên 1:6. “Deus disse: ‘Haja um firmamento no meio das águas e que ele separe as águas das águas’, e assim se fez”.). Outro dos grandes equívocos, que perdurou até o século XVI, foi a crença na imobilidade da Terra, em cujo redor giraria o universo, inclusive o sol. Em Josué 10:13, está escrito que “o sol se deteve no meio do céu, e a lua parou, até que o povo se vingou de seus inimigos.” Galileu, que era concordava com Copérnico, quanto ao heliocentrismo, foi obrigado a retratar-se perante a Igreja Católica, mas continuava afirmando, referindo-se ao globo terrestre, que eppur si muove.

Mas, desde a antigüidade, houve a dúvida a respeito de ter ou não havido um momentum da criação. Com um mínimo de raciocínio, sempre nos assaltou a dúvida a respeito do que Deus estaria fazendo antes de criar o universo. Aristóteles acreditava que o mundo e a raça humana sempre tinham existido e que, periodicamente, dilúvios e outros desastres devolviam a humanidade ao estado de barbárie. Assim, não teria havido criação, mas sim um número incomensurável de gerações de civilizações.

Mas tudo isso provém de uma visão ainda extremamente limitada do universo, que atribuía ao insignificante planeta Terra uma importância absurdamente grande. É interessante notar que, mesmo no século XX, nossa capacidade de abstração a esse respeito ainda era tão limitada que mesmo os principais autores de ficção científica, só a partir dos anos 1950, conseguiram “afastar-se” do minúsculo punhado de poeira que é nosso sistema solar.

Sabemos hoje que a nossa Via Láctea, mesmo contendo 200 bilhões de estrelas (a codificação espírita fala de 50 milhões), é apenas uma no meio de uma quantidade inimaginável de galáxias no infinito. Por outro lado, já em 1929, Edwin Hubble havia observado que, para onde quer que se “olhasse”, as galáxias estão se afastando rapidamente da nossa (ou umas das outras). Esta foi a descoberta que trouxe para o domínio da ciência a questão do começo do universo. Tentar imaginar a distância percorrida pelas galáxias que se distanciam é mais do que estonteante.  Dentro da nossa Via Láctea, a estrela mais próxima de nós está a 75,7 trilhões de quilômetros.

Ora, se o universo está em expansão, quer dizer que, recuando no tempo algo como vinte bilhões de anos (mera abstração, porque ano é uma medida terrena e então a Terra ainda não existia), encontraremos o universo compacto, infinitamente pequeno e infinitamente denso. Este seria o momento do Big Bang. Já há cientistas que admitem ciclos de expansão e contração do universo, numa repetição eterna a cada vinte ou sabe-se lá quantos bilhões de “anos”. De qualquer forma, cientistas da física falam do Big Bang como o princípio do universo e do Big Crunch como seu fim. O que já se sabe é que, mesmo estando o universo em expansão, existem os buracos negros, que atraem toda a matéria em redor de si, inclusive a luz, que não consegue escapar-lhe à inimaginável força gravitacional.

É claro que, quando falamos de tais medidas, só podemos abstrair. Li não me lembro onde que um professor de física assim respondeu a um aluno que insistia quanto a um conceito de eternidade: “Imagine que a Terra seja uma esfera de bronze e que uma andorinha passe voando, a cada dois mil anos, e roce a sua superfície com uma das asas. Quando o globo terrestre estiver totalmente desintegrado pela fricção das penas da andorinha, estará começando a eternidade.”

Mas, falando de tempo e de espaço, convém lembrar que, antes da teoria geral da relatividade, de Albert Einstein, as coisas nos pareciam mais simples. Tempo e espaço eram consideradas dimensões absolutas. O universo nos parecia determinístico e de mecânica totalmente explicada pela gravitação dos corpos. Aí passamos a saber que espaço e tempo são quantidades dinâmicas e não apenas afetam, mas também são afetados por tudo o que ocorre no universo. Assim, diz-nos Stephen Hawkins, que “não se pode falar de eventos no universo sem as noções de espaço e tempo” (...) e acrescenta que, “na relatividade geral, torna-se sem sentido falar de espaço e tempo fora dos limites do universo.”

Também foi no início do século XX que se descobriu que o átomo (do grego a + tomos = sem divisão) é afinal de contas composto de partículas. Atualmente, além dos “tradicionais” Elétron, Próton e Nêutron, já são conhecidos Quark, Pósitron, Antipróton,
Antinêutron, Fóton, Gráviton, Méson, Híperon e Neutrino. Afinal de contas, quais são as partículas elementares?

A mecânica quântica (a partir dos estudos de Max Planck) nos diz que todas as partículas são na verdade ondas. Assim, há partículas que não podem ser identificadas, mas é sabido que existem, porque têm efeitos mensuráveis, a partir do spin, propriedade comum a todas as partículas, porém variável de partícula para partícula.

Só a título de informação, já se sabe também que toda partícula que constitui a matéria tem uma partícula complementar de antimatéria, com a mesma massa e carga elétrica oposta. No entanto, o universo observável é claramente feito de matéria, e não de antimatéria. Com efeito, uma partícula e uma anti-partícula em contato se autodestruiriam mutuamente, numa liberação incomensurável de energia.

O fluido cósmico é descrito no livro dos espíritos como uma matéria primeva, o que de certa forma antecipa a física quântica. Contudo, a descrição na Gênese, na Codificação Espírita, fala de uma matéria cósmica primitiva, esparsa em todo o infinito, de onde teriam, através de um processo de condensação, sido formados os diversos corpos celestes. Também não parece coincidir com os avanços da física moderna a idéia de espaço e tempo como dimensões absolutas. Por outro lado, ali se afirma que “uma única lei, primordial e geral, foi outorgada ao universo, para assegurar-lhe eternamente a estabilidade”, o que conflita com a teoria dos ciclos de expansão e contração do universo. De qualquer forma, o espírito que ditou as explicações ao codificador salientou que, embora tendo acesso a mais informações do que a população encarnada de então, também se reconhecia ignorante ante a grandiosidade do tema.

Na Gênese espírita, VI, 14, está dito que “existindo, por sua natureza, desde a eternidade, Deus criou desde toda eternidade e não poderia ser de outro modo, visto que, por mais longíngua que seja a época a que recuemos, pela imaginação, os supostos limites da criação, haverá sempre, além desse limite, uma eternidade.”

Finalmente, lembremos que está dito, na codificação espírita, que: “o Espiritismo e a Ciência se completam reciprocamente”; (...) ao Espiritismo, sem a Ciência, faltariam apoio e comprovação. (...) “Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará.”
 

terça-feira, 11 de outubro de 2016

RESPOSTA DO EX-PRESIDENTE LULA AO JORNAL NACIONAL

“Eu, Luiz Inácio Lula da Silva, e minha mulher, Marisa Letícia, não somos e nunca fomos donos de nenhum apartamento tríplex no Guarujá nem em qualquer outro lugar do litoral brasileiro.
Meu patrimônio imobiliário hoje é exatamente o mesmo que eu tinha ao assumir a presidência da República, em janeiro de 2003:
O apartamento onde moro com Marisa, e onde já morávamos antes do governo,  e o rancho “Los Fubangos”, um pesqueiro na represa Billings.
Ambos adquiridos a prestações. Também temos dois apartamentos de 70 metros quadrados que Marisa recebeu em permuta por um lote que ela herdou da mãe.
Tudo em São Bernardo do Campo. Tudo registrado em nosso nome no cartório e na declaração anual de bens.
Esta é a verdade dos fatos, em sua simplicidade: entrei e saí da Presidência da República com os mesmos imóveis que adquiri ao longo da vida, trabalhando desde criança, como sabem os brasileiros.
Não comprei nem ganhei apartamento, mansão, sítio, fazenda, casa de praia, no Brasil ou no exterior.
Jamais ocultei patrimônio nem registrei propriedade particular em nome de outras pessoas.
Nunca registrei nada em nome de empresas fictícias com sede em paraísos fiscais, artifício utilizado por algumas das mais ricas famílias deste País para fugir ao pagamento de impostos.
As informações sobre o patrimônio do Lula – verdadeiras, fidedignas, documentadas – sempre estiveram à disposição do Ministério Público e da imprensa, inclusive da Rede Globo.
Estas informações foram deliberadamente ocultadas do público na reportagem do Jornal Nacional que apresentou as acusações do Ministério Público de São Paulo.
Eu não fui procurado pela Globo para apresentar meu ponto de vista. Ninguém da minha assessoria foi procurado. O direito ao contraditório foi sonegado.
Alguém se apropriou indevidamente do meu direito de defesa.
Não é a primeira vez que isso acontece e certamente não será a última.
Mas eu fiquei indignado ao ver minha mulher e meu filho sendo retratados na televisão como se fossem criminosos.
Mesmo na mais acirrada disputa política – e o jornalismo não está acima dessas disputas – nada justifica envolver a família, a mulher, os filhos, como ocorreu nesse caso.
Fiquei indignado porque, ao longo de 9 minutos, o apresentador William Bonner e o repórter José Roberto Burnier me acusaram 18 vezes de ter cometido 10 crimes diferentes; sem nenhuma prova, endossando as leviandades de três membros do Ministério Púbico de São Paulo.
Reproduziram ofensas, muitas ofensas, a partir de uma denúncia que sequer foi aceita pela juíza. E ainda por cima, denúncia de um promotor que já foi advertido pelo Conselho Nacional do Ministério Público, porque atuou fora da lei neste caso.
A Rede Globo me conhece o suficiente para fazer uma avaliação equilibrada das acusações lançadas por aquele promotor, antes de reproduzi-las integralmente pelas vozes de William Bonner e Roberto Burnier.
A Rede Globo recebeu, desde 31 de janeiro, todas as informações referentes ao tríplex, com documentos que comprovam que nem eu nem Marisa nem nosso filho Fabio somos donos daquilo. É uma longa e detalhada nota, chamada “Os documentos do Guarujá: desmontando a farsa”.
Cheguei a abrir mão do meu sigilo fiscal e anexei a esta nota parte de minha declaração de bens.
Quando divulgamos este documento esclarecedor, o Jornal Nacional fez uma série de matérias tentando desqualificar o que estava dito lá. Duvidaram de cada detalhe, procuraram contradições, chegaram a distorcer uma entrevista do meu advogado.
Quanta diferença…
Na reportagem sobre a denúncia do procurador, nada foi questionado. Tudo foi endossado e ratificado como se fosse absoluta verdade.
A Rede Globo sempre poderá dizer que estava apenas “retratando os fatos”, “prestando informações à sociedade”,  “cumprindo seu dever jornalístico”.
Só não vai conseguir explicar ao povo brasileiro a diferença gritante de tratamento: quando acusam o Lula, é tudo verdade; quando o Lula se defende, é tudo suspeito.
Em 40 anos de vida política, aprendi a lidar com o preconceito, com a inveja e até com o ódio político.
Mas não me conformo, como ex-presidente desse imenso país chamado Brasil, não posso me conformar de ser comparado a um traficante de drogas, como aconteceu no final da reportagem.
Essa comparação ofensiva, injuriosa, caluniosa, não está nos autos da denúncia do Ministério Público.
Não sei quem decidiu incluir isso na reportagem, mas posso avaliar seu caráter.
Se esta mensagem está sendo lida hoje na Rede Globo é por uma decisão da Justiça, com base na Lei do Direito de Resposta, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pela presidenta Dilma Rousseff no final do ano passado.
Esta lei garante que a Liberdade de Imprensa seja realmente um direito de todos e não um privilégio daqueles que detém os meios de comunicação.
É ela que nos permite enfrentar a ocultação de informações, a sonegação do contraditório, a falsidade informativa, a lavagem da notícia.
Estes vícios foram sistematicamente praticados pelos grandes veículos de comunicação do Brasil durante a ditadura e fizeram tão mal ao País quanto a censura, que abolimos na Constituição de 1988.
A Rede Globo levou mais de 30 anos para pedir desculpas ao País por ter apoiado a ditadura, praticando um jornalismo de um lado só. Graças à lei do Direito de Resposta, não tenho de esperar tanto tempo para responder às ofensas dirigidas a mim e a minha família no Jornal Nacional.
Eu não estou usando este direito de resposta para me defender apenas, e a minha família. É para defender a democracia, o estado de direito e a própria liberdade de imprensa, que só é verdadeira quando admite o contraditório e respeita a verdade dos fatos.
Quando estes princípios são ignorados, em reportagens como aquela do Jornal Nacional, o maior prejudicado não é o Lula, é cada cidadão e a sociedade, é a democracia”.







Você sabe Português? (3)

21 O livro é para “mim” ler. Mim não lê, porque não pode ser sujeito. Assim: para eu ler, para eu fazer, para eu escrever.
22 Está tudo certo entre “eu” e você. Depois de preposição, usa-se mim ou ti. Está tudo certo entre mim e você./ Está tudo certo entre eles e ti.  
23 Deixei “ele” no serviço. Eu, tu, ele, nós, vós e eles não devem ser empregados como objeto direto. Assim: Deixei-o no serviço./ Viu-a na festa./Mande-os voltar./ Encontrou-nos no lugar marcado.
24 Não “lhe” conheço. Lhe não pode ser usado com verbos diretos, pois substitui a ele, a eles, a você e a vocês: Não o conheço./ Nunca a deixarei. / Nós o convidamos./ O marido a largou. Dois exemplos com lhe: Pedi-lhe (a ele) favor./ Ficou contente e lhe (a ele) agradeceu.
25 A firma “daria-lhe” a promoção? Não usa pronome átono (me, te, se lhe, nos e lhes) depois do futuro do presente, futuro do pretérito (antigo condicional) e particípio. Assim: A firma lhe daria (ou dar-lhe-ia, forma rebuscada atualmente) a promoção?/ Eles afirmarão pela competência (e nunca “afirmarão-se”)./O colega nos fará (e não  fará-nos) o favor./ Havendo-me pedido... (e nunca havendo “pedido-me” ).
26 É claro que “trata-se” de engano. O que aí é pronome: É claro que se trata de engano. O mesmo ocorre com as negativas: Não o diga a ninguém/Nunca lhe revelei o fato./Ninguém nos procurou.

27 Quando “falava-se” dele... Quando e outras conjunções subordinativa (enquanto, embora, segundo, como etc.) atraem o pronome: Quando se falava dele.../ Enquanto o prestigiaram.../ Como lhe pediram.../ Embora se cuide... Segundo nos disseram...



segunda-feira, 10 de outubro de 2016

O LEGADO DE DOM HELDER CAMARA

Frei Betto

O arcebispo Dom Helder Camara (1909-1999) é figura singular na história da Igreja Católica no Brasil. Diminuto, magérrimo, poucos o superavam em oratória: adornava as ideias com gestos efusivos e um senso de humor incomum ao se tratar de bispos. Por onde andasse, lotava auditórios: Paris, Nova York, Roma... Entre os anos de 1960-80, apenas dois brasileiros gozavam de ampla popularidade no exterior: Pelé e Dom Helder.
 Tamanho o carisma dele que, em 1971, em Paris, convidado a falar num salão capaz de comportar 2 mil pessoas, tiveram que transferi-lo para o Palácio de Esportes, que abriga 12 mil.
Hábitos simples
Conheci-o em 1962, ao chegar ao Rio, vindo de Minas, para integrar a direção nacional da JEC (Juventude Estudantil Católica). Dom Helder era bispo-auxiliar da arquidiocese carioca e responsável pela Ação Católica. Vivia de seu salário como assessor técnico (aprovado em concurso público) do Ministério da Educação, morava modestamente, almoçava em botequim – ou melhor, beliscava, pois a vida toda comeu como passarinho – e subia as favelas como quem se sente em casa, sempre trajando batina, hábito mantido por toda a vida, mesmo quando o Concílio Vaticano II (1962-1965) permitiu aos clérigos saírem à rua em trajes civis.
Desde seus tempos de seminarista em Fortaleza – nascera em Messejana, hoje bairro da capital cearense – Dom Helder cultivava hábitos incomuns: deitava-se por volta das dez ou onze da noite, levantava-se às duas da madrugada, trocava a cama por uma cadeira de balanço, na qual orava, meditava, lia e escrevia cartas e poemas. Todos os seus livros foram concebidos naquele momento de “vigília”, como dizia. Às quatro retornava ao leito, dormia por mais uma hora para, em seguida, celebrar missa e iniciar seu dia de trabalho.
 Com frequência Dom Helder visitava a “república” das Laranjeiras, onde se amontoavam os estudantes dirigentes da JEC e da JUC (Juventude Universitária Católica). Betinho (Herbert Jose de Souza) e José Serra, líderes estudantis, encontravam ali hospedagem garantida ao vir de Minas ou São Paulo.
 Era Dom Helder quem nos assegurava, graças a seus relacionamentos em todas as camadas sociais, passagens aéreas pelo Brasil, bolsas de estudos, e até alimentação. Na época, o governo dos EUA, preocupado com a ameaça comunista na América Latina (sobretudo após a vitória da Revolução Cubana), lançara a campanha “Aliança para o Progresso”, que consistia, basicamente, em remeter alimentos às famílias miseráveis.
 Para socorrer-nos da penúria na “república”, Dom Helder, responsável pela distribuição dos donativos, nos enviava caixas de papelão contendo o que denominávamos “leite da Jaqueline” e “queijo do Kennedy”. Como os produtos ficavam meses no porto, sujeitos ao calor carioca, vários de nós tivemos problemas de saúde por ingeri-los.
Senso de oportunidade
O maior sonho de Dom Helder era a erradicação da miséria no mundo. Sonhava com o ano 2000 sem fome. Ainda no Rio, criou o Banco da Providência e a Cruzada São Sebastião, no intuito de pôr fim às favelas. Graças a doações, edificou no Leblon um conjunto de prédios, para cujos apartamentos transferiu famílias de uma favela próxima. Não deu certo. Sem recursos para pagar os impostos (luz, água, telefone...), os moradores passaram a sublocar os domicílios e a obter renda graças à venda de torneiras, pias e outras peças do imóvel. 
 Para angariar recursos a suas obras, Dom Helder não titubeava em comparecer a programas de auditório de grande audiência televisiva. Certa ocasião foi convidado por um apresentador para sortear prendas expostas no palco e vistas por todos, exceto pela pessoa trancada numa cabine opaca. Calhou de ser um desempregado. “Seu Joaquim, o senhor troca isto por aquilo?” E sem nomear o objeto, Dom Helder apontava um liquidificador e, em seguida, um carro. Seu Joaquim respondia “sim” e toda a platéia vibrava. Em seguida, Dom Helder indagou se trocava o carro por um abridor de latas. O homem topou. E não mais arredou pé, cismou que escolhera a melhor prenda. Ao sair da cabine, recebeu dos patrocinadores, decepcionado, o abridor. E Dom Helder mereceu um polpudo cheque. O arcebispo não teve dúvidas: “Seu Joaquim, o senhor troca este cheque pelo abridor?
 No dia seguinte, no Palácio São Joaquim, onde funcionava a cúria do Rio, criticamos Dom Helder por ter aberto mão de um recurso que poderia reforçar suas obras sociais. Ele justificou-se: “Perdi o cheque, ganhei em publicidade. Esperem para ver quanto dinheiro vou angariar.”
Visão empreendedora
Homem carismático, dotado de forte espírito gregário, era difícil alguém – incluído quem o criticava – não se deixar envolver pela energia que dele emanava no contato pessoal. JK quis que se candidatasse a prefeito do Rio. Dom Helder jamais aceitou meter-se em política partidária; bastava-lhe, como lição, o erro de juventude, quando demonstrou simpatia pelos integralistas.
 Por sua iniciativa, foram fundados, em 1955, o CELAM – Conselho Episcopal Latino-Americano -, que congrega e representa os bispos do nosso Continente, e a CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, pólo articulador dos prelados de nosso país, do qual ele foi o primeiro secretário-geral.
Bispo vermelho
 Numa época em que não havia Igreja progressista nem Teologia da Libertação, Dom Helder, graças à sua sensibilidade social e sua opção pelos pobres, era tido por comunista, difamação acentuada após a implantação da ditadura militar no Brasil, em 1964. Costumava comentar: “Se defendo os pobres, me chamam de cristão; se denuncio as causas da pobreza, me acusam de comunista”. 
 Nomeado arcebispo de São Luís (MA) no mesmo mês do golpe, antes de tomar posse o papa Paulo VI o transferiu para Olinda e Recife, onde permaneceu até morrer.
 Em 1972 o nome de Dom Helder despontou como forte candidato ao Prêmio Nobel da Paz. Há fortes indícios de que não foi laureado por duas razões: primeiro, pressão do governo Médici. A ditadura se veria fortemente abalada em sua imagem exterior caso ele fosse premiado. Mesmo dentro do Brasil Dom Helder era considerado persona non grata. Censurado, nada do que o “arcebispo vermelho” falava era reproduzido ou noticiado pela mídia de nosso país.
 A outra razão: ciúmes da Cúria Romana. Esta considerava uma indelicadeza, por parte da comissão norueguesa do Nobel da Paz, conceder a um bispo do Terceiro Mundo um prêmio que deveria, primeiro, ser dado ao papa...
 No Recife, Dom Helder lançou a Operação Esperança: promoveu reforma agrária nas terras da arquidiocese; passou a visitar favelas, mocambos e bairros pobres; estreitou laços com artistas, universitários e intelectuais.
 Graças ao seu poder de articulação e carisma profético, em 1973 bispos e superiores religiosos do Nordeste fizeram ecoar a primeira denúncia cabal à ditadura feita por católicos: o manifesto “Ouvi os clamores de meu povo”. O documento, recolhido pela repressão, foi divulgado através de edições clandestinas mimeografadas.
Homem de fé
Um dia, o governo militar, preocupado com a segurança do arcebispo de Olinda e Recife, temendo que algo acontecesse a ele – um atentado ou “acidente” - e a culpa recaísse sobre o Planalto, enviou delegados da Polícia Federal para lhe oferecer um mínimo de proteção. Disseram-lhe: “Dom Helder, o governo teme que algum maluco o ameace e a culpa recaia sobre o regime militar. Estamos aqui para lhe oferecer segurança”.
 Dom Helder reagiu: “Não preciso de vocês, já tenho quem cuide de minha segurança”. “Mas, Dom Helder, o senhor não pode ter um esquema privado. Todos que dispõem de serviço de segurança precisam registrá-lo na Polícia Federal. Esta equipe precisa ser de nosso conhecimento, inclusive devido ao porte de armas. O senhor precisa nos dizer quem são as pessoas que cuidam da sua segurança.”
 Dom Helder retrucou: “Podem anotar os nomes: são três pessoas, o Pai, o Filho e o Espírito Santo.”
 Dom Helder morava numa casa modesta ao lado da igreja das Fronteiras, no Recife. Frequentemente, as pessoas que tocavam a campainha eram atendidas pelo próprio arcebispo. Certa noite, a polícia fez batida numa favela da capital pernambucana, em busca do chefe do tráfico de drogas. Confundiu um operário com o homem procurado. Levou-o para a delegacia e passou a torturá-lo.
 Pela lógica policial, se o preso apanha e não fala é porque é importante, treinado para guardar segredos. Vizinhos e a família, desesperados, ficaram em volta da delegacia ouvindo os gritos do homem. Até que alguém sugeriu à esposa do operário recorrer a Dom Helder.
  A mulher bateu na igreja das Fronteiras: “Dom Helder, pelo amor de Deus, vem comigo, lá na delegacia do bairro estão matando meu marido a pancadas.” O prelado a acompanhou. Ao chegar lá, o delegado ficou assustadíssimo: “Eminência, a que devo a honra de sua visita a esta hora da noite?”
 Dom Helder explicou: “Doutor, vim aqui porque há um equívoco. Os senhores prenderam meu irmão por engano.” “Seu irmão?!” É, fulano de tal – deu o nome – é meu irmão”. “Mas, Dom Helder – reagiu o delegado perplexo -, o senhor me desculpe, mas como podia adivinhar que é seu irmão. Os senhores são tão diferentes!”
 Dom Helder se aproximou do ouvido do policial e sussurrou: “É que somos irmãos só por parte de Pai”. “Ah, entendi, entendi.” E liberou o homem.
 De fato, irmãos no mesmo Pai.
Perseguições e direitos humanos
Durante o regime militar, Dom Helder moveu intensa campanha no exterior de denúncia de violações dos direitos humanos. O governador de São Paulo, Abreu Sodré, tentou criminalizá-lo. Alegava ter provas de que Dom Helder era financiado por Cuba e Moscou. Alguns bispos ficavam sem saber como agir, como foi o caso do cardeal de São Paulo, Dom Agnelo Rossi, amigo do governador e de Dom Helder. Não foi capaz de tomar uma posição firme na contenda. Mais tarde a denúncia caiu no vazio, não havia provas, apenas recortes de jornais.
 Incomodava ao governo ver desmoralizada, pelo discurso de Dom Helder, a imagem que ele queria projetar do Brasil no exterior, negando torturas e assassinatos. Dom Helder ressaltava que, se o governo brasileiro quisesse provar que ele mentia, então abrisse as portas do país para que comissões internacionais de direitos humanos viessem investigar, como havia feito a ditadura da Grécia.
 Se hoje, na Igreja, se fala de direitos humanos, especificamente na Igreja do Brasil, que tem uma pauta exemplar de defesa desses direitos, apesar de todas as contradições, isso se deve ao trabalho de Dom Helder. Nenhum episcopado do mundo tem agenda semelhante à da CNBB na defesa dos direitos humanos. A começar pelos temas anuais da Campanha da Fraternidade: idoso, deficiente, criança, índio, vida, segurança etc.  Neste ano de 2010, economia. Isso é realmente um marco, algo já sedimentado. Também as Semanas Sociais, que as dioceses, todos os anos, promovem pelo Brasil afora, favorecem a articulação entre fé e política, sem ceder ao fundamentalismo.
 A Igreja Católica e o Brasil devem muito a Dom Helder Câmara, que desclandestinizou a pobreza existente em nosso país e induziu poder público e cristãos a encarar com seriedade os direitos dos pobres à vida digna e feliz. O profeta nascido em Messejana foi, sim, um autêntico discípulo de Jesus Cristo.




sábado, 8 de outubro de 2016

Sem prova, ministro da Justiça acusa PM de chacina e vira alvo de ação


Reprodução/TV Globo
Soldado da Policia Militar e principal suspeito de chacina em Carapicuiba Foto:Reproducao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes,
em entrevista à TV Globo em setembro de 2015
O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, tornou-se alvo de um processo de reparação por danos morais. A ação foi movida por um policial militar acusado por ele, sem provas, de ser o responsável por uma chacina.

soldado é Douglas Gomes Medeiros que, em setembro de 2015, foi preso sob a suspeita de ter matado a tiros quatro jovens em uma pizzaria de Carapicuíba, na Grande São Paulo. À época, como secretário de Segurança Pública do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), Moraes concedeu uma série de entrevistas nas quais afirmou que o PM havia praticado o crime.
E justificou: dias antes, segundo Moraes, o grupo de jovens tinha roubado e agredido a mulher desse policial.
"A bolsa da mulher foi encontrada com os pertences das vítimas. E o policial, lamentavelmente, ao querer se vingar –ao invés de comunicar a polícia para que realizasse as prisões– acabou praticando esses crimes", disse Moraes, à época, à TV Globo.
Ocorre, porém, que isso não era verdade. Conforme a Folha revelou em maio, a polícia nunca encontrou a bolsa na casa dos quatro jovens mortos na pizzaria. Foi encontrada oito dias antes da chacina, na casa de pessoas sem ligação com as vítimas e a mais de 4 km da rua onde elas moravam –a Dallas.
A bolsa foi achada por acaso, em uma blitz policial na casa de suspeitos de roubos. Estava em meio a drogas, armas e uma moto roubada.
Quando a defesa do PM levou esses detalhes à Justiça na instrução processual, o próprio Ministério Público disse não ter provas suficientes para manter a acusação. O PM, então, foi colocado em liberdade em abril.
Edison Temoteo/Futura Press/Folhapress
Morador observa sangue de vítimas no local dos assassinatos, em Carapicuíba (Grande SP)
Morador observa sangue de vítimas no local dos assassinatos, na região central de Carapicuíba
Procurado, o ministro da gestão Temer (PMDB) não quis falar sobre o caso.
A chacina dos quatro jovens em Carapicuíba ocorreu menos de um mês após os ataques de Osasco e Barueri, também na Grande SP, que deixaram 23 mortes.
Esse novo crime havia deixado a polícia pressionada. Medeiros foi preso cinco dias após o crime. Sua prisão foi apresentada como propaganda da agilidade da polícia na gestão de Moraes.
Na ação, o PM pede R$ 60 mil de indenização. No texto, usa trechos de obras publicadas por Moraes, que é professor de direito e respeitado autor de obras sobre o tema, para demonstrar que ele feriu a presunção de inocência.
"Há a necessidade de o Estado comprovar a culpabilidade do indivíduo, que é constitucionalmente presumido inocente, sob pena de voltarmos ao total arbítrio estatal, permitindo-se o odioso afastamento de direitos e garantias individuais", diz trecho de livro de Moraes.







domingo, 2 de outubro de 2016

SABE POR QUE OS HOMENS RARAMENTE ESTÃO DEPRIMIDOS?


 Não engravidam.
 Não menstuam.
 Não gastam dinheiro com salão de beleza...
Os mecânicos não mentem pra eles...
Nunca precisam procurar outro posto de gasolina para achar um banheiro limpo.
Rugas são traços de caráter...
Barriga é prosperidade...
Cabelos brancos são charme...
Ninguém fica encarando os peitos deles quando estão falando.
Os sapatos não lhes machucam os pés.
As conversas ao telefone duram apenas 30 segundos.
Para férias de 5 dias, apenas precisam de uma mochila.
Se outro aparecer na mesma festa usando uma roupa igual, não há problema..
Cera quente não chega nem perto.
Ficam assistindo a TV com um amigo, em total silêncio, por muitas horas, sem ter que pensar: "Deve estar cansado de mim..."
Se alguém se esquece de convidá-los para alguma festa, ainda assim vai continuar sendo seu amigo.
Sua roupa íntima custa no máximo 20 reais (em pacote de 3)
Três pares de sapatos são mais que suficientes! (verdade)
São incapazes de perceber que a roupa está amassada.
Seu corte de cabelo pode durar anos, aliás, décadas.
Meia dúzia de cervejas e um jogo de futebol na televisão  são o suficiente para extrema felicidade.
Os shoppings não fazem falta nenhuma para eles.
Podem deixar crescer o bigode.
Se um amigo chamá-lo de gordo, careca, bicha velha etc..., não abala em nada a amizade, aliás, é prova de grande amizade.
Podem comprar os presentes de Natal para 25 pessoas, no dia 24 de dezembro em, no máximo, 25 minutos!!!

Que maravilha é ser homem!!!