Rodrigo Pinto
Da BBC Brasil em Londres
Aumentos de impostos, sucessivas altas nas tarifas de
serviço público, corte de pensões e salários, demissões e medo do dia
de amanhã. Tudo isso faz parte das experiências da comunidade brasileira
na Grécia.
Roberta foi para Grécia em busca de trabalho e não quer voltar, apesar da crise |
Relatos dos residentes dão a dimensão
do
aprofundamento da situação no país, símbolo maior da mais grave crise da zona do euro.A vivência na antes turbulenta economia brasileira ajuda a dar fôlego para superar o mau momento.
Apesar da crise, a manicure Roberta de Souza Raimundo, na Grécia há 11 anos, não pensa em regressar ao Brasil. "Enquanto eu puder, vou ficar e apoiar, porque me receberam muito bem em uma época que não havia oportunidade no Brasil", conta ela.
Roberta cursou faculdade de Hotelaria, foi para a Grécia de férias, ficou 4 anos ilegal no país, casou-se e acabou se profissionalizando como manicure, atividade da tia, Márcia de Souza Batista que morou na Grécia por 18 anos. "Eu gostei tanto daqui que aprendi o idioma em três meses", lembra.
"Mas, como os gregos têm dito ultimamente, teremos que aprender a viver com menos. Para nós brasileiros, nascidos na crise, este não chega a ser um grande problema", acrescenta.
Muitos de seus clientes Roberta herdou da tia, Márcia, que com o marido desempregado há meses e a clientela reduzida a 50%, não viu outra saída a não ser deixar a Grécia.
Motivada pelo bom momento da economia brasileira Márcia resolveu fazer o caminho de volta. Hoje ela mora em São Paulo, onde abriu uma lanchonete com o marido.
"Fui para a Grécia porque o Brasil estava em crise", conta ela. "Estamos indo bem. Embora eu sinta dó dos gregos, acho que saí na hora certa", avalia.
'Aprender a viver com menos'
De acordo com a Embaixada Brasileira na Grécia, há aproximadamente 3 mil brasileiros no país. A maior parte deles, mulheres casadas com trabalhadores do poderoso setor de navegação do país mediterrâneo.
Há também filhos de gregos nascidos no Brasil que optaram pela vida na Europa, jogadores de futebol, dançarinos e capoeiristas. "A maior parte dos brasileiros que residem aqui não tem qualificação superior, a exceção de médicos e trabalhadores do setor de turismo", diz o primeiro secretário da Embaixada, Gustavo Bezerra.
"Há, ainda, muitas mulheres que trabalham como faxineiras e manicures", acrescenta ele, destacando dois segmentos que costumavam atrair muitas brasileiras.
Há 18 anos em Atenas, Viviane Fiorentino se emociona ao falar da crise. Dona de um spa para pés e mãos, viu a clientela encolher 70% e teve que dispensar quatro dos cinco funcionários. Mas afirma que vai esperar mais dois anos antes de tomar a decisão de voltar ao Brasil.
"Minhas amigas gregas não têm como sair. Elas sempre dizem que vamos superar este momento juntas...(chora) Desculpe, isso me emociona muito. Minhas amigas são muito solidárias, como é todo o povo aqui. Tenho uma gratidão enorme, porque me receberam bem quando eu mais precisava. Este é um povo carinhoso que não me deixa sentir saudade do amor brasileiro. Enquanto minhas economias durarem, eu fico", diz, com voz embargada.
Laços de família
Assim como Roberta e Viviane, outros que criaram laços e família no país acabam fazendo com que a comunidade brasileira continue crescendo. "Há brasileiros deixando o país, mas o número de certidões de nascimento que emitimos em 2011 foi 50% maior do que em 2010, chegando a 97. Ou seja, a comunidade deve até crescer", diz o diplomata Gustavo Bezerra.Com uma taxa de desemprego de 20% e a miséria batendo à porta (19% dos gregos já se encontram nesta condição, de acordo com a Eurostat, agência europeia de estatística), nem sempre o coração fala mais alto.
"Vamos lutar para ficar. Agora, se a situação se tornar muito difícil, não dá para ficar com sentimentalismo"
Isabel Cardoso de Brito, professora
Funcionária pública (setor que sofre com cortes salariais), mãe de dois filhos e residente em Atenas há 26 anos, Isabel Cardoso de Brito lembra que o Brasil está em um bom momento, mas ainda tem enormes problemas, como altos índices de criminalidade.
"Não quero sair da Grécia por conta da crise. Sairia por opção", afirma ela, professora da rede pública de ensino grega. "Vamos lutar para ficar. Agora, se a situação se tornar muito difícil, não dá para ficar com sentimentalismo", pondera.
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