por Francisco Frassales Cartaxo
“Aos poucos, a política de princípios cedeu lugar à política de resultados. (...) O frágil apoio parlamentar abriu caminho aos operadores da política de resultados, que lançaram mão de práticas que, trazidas à luz, macularam gravemente o caráter ético do partido”.
Palavras de Frei Betto, frade dominicano, jornalista, antropólogo, filósofo, teólogo, preso político torturado pela ditadura, escritor com mais de 50 livros publicados. Foi Assessor Especial do presidente Lula, em 2003 e 2004, quando participou da coordenação do Programa Fome Zero. A citação é do livro A mosca azul – reflexão sobre o poder (Ed Rocco, 2006).
Ainda é cedo para prever com segurança todas as consequências da Ação Penal 470, em curso no Supremo Tribunal Federal. A essa altura, contudo, já é possível antever, pelo menos, dois efeitos imediatos relacionados com a eleição deste ano: a queda na arrecadação de recursos para a campanha municipal e as perdas eleitorais de candidatos filiados ao PT.
A retração na coleta de recursos para custear as despesas da campanha eleitoral decorre da óbvia desconfiança de tradicionais financiadores (empresas e pessoas físicas), temerosos de serem acusados de abastecer o caixa 2 de partidos e candidatos, portanto, praticantes de atos ilícitos passíveis de punição. Essa consequência do julgamento dos réus da Ação Penal 470, transmitido ao vivo pela TV Justiça, alcança de forma generalizada partidos e coligações, mas recai com força sobre o PT, acusado de ser o responsável pelo esquema de corrupção, objeto daquele processo judicial. Para piorar a situação do PT, entre os réus encontra-se o deputado João Paulo Cunha, já condenado, o que coloca em maior evidência ainda o ônus imposto ao PT, por ser ele personagem importante na hierarquia de seu partido, líder da bancada e ex-presidente da Câmara Federal. E, como se não bastasse, João Paulo postulava a prefeitura de Osasco, sendo forçado a desistir da candidatura em razão da sua condenação.
A outra consequência do mensalão tem caráter difuso, algo que paira no ar, embora não se possa medir. Mas nem por isso, deixa de pesar na decisão do eleitor na hora de definir seu voto por um candidato. Por este ou aquele partido. Mesmo não sendo palpável como o caixa 2, essa outra consequência embrenha-se na sensação de indignação, no sentimento de decepção que acabrunha militantes sincero do PT, abalados em seu orgulho ostentado, anos a fio, de olhar para os “outros” com a superioridade de quem se autoproclamava diferente. Orgulho de quem não se enlameava no charco da política subalterna. Militantes e simpatizantes do PT exibiam troféus de grande valia, graças a significativas conquistas da democracia brasileira, obtidas com a grandeza da ação do PT: participação popular nas decisões acerca da aplicação dos recursos públicos, diálogo com os movimentos sociais, efetiva execução de políticas de inclusão social, redução das desigualdades regionais e pessoais de renda, independência nas relações internacionais.
É certo que essas conquistas ninguém apaga. Estão inscritas na história política e administrativa do Brasil, vinculadas ao jeito petista de governar sem medo de ser feliz. No entanto, esse patrimônio foi atingido agora pela revelação oficial de práticas constatadas pela mais alta corte da Justiça brasileira. Práticas que macularam gravemente o caráter ético do partido, como disse Frei Betto.
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